🎙️Entrevista - SEGREGATORUM


Com o lançamento do EP Path Worse Than Death, a banda brasileira Segregatorum impõe-se no cenário do metal extremo com uma sonoridade intensa, profundamente emocional e artisticamente cuidada. Nascidos no sul do Brasil, os Segregatorum combinam o peso do death/doom com atmosferas progressivas e melancólicas, construindo um universo sombrio que não se limita a provocar — também convida à reflexão. Nesta entrevista exclusiva para o blog, falam-nos da sua génese, das dores que os inspiram, do impacto da geografia na sua arte e até da marcante colaboração com Tim “Ripper” Owens. Para fãs de peso, honestidade e um olhar cru sobre a realidade.


Path Worse Than Death apresenta uma sonoridade densa e emocionalmente intensa. Como nasceu este trabalho e que experiências pessoais ou coletivas da banda alimentaram esse processo criativo?

Antes de mais, muito obrigado pelo teu interesse e apoio Miguel. É perfeita essa leitura da intensidade emocional. Este EP nasceu ainda durante o período da pandemia. Na altura, tínhamos riffs e letras prontos, mas não havia oportunidade de ir ao estúdio gravar. Essas ideias ficaram guardadas, reprimidas, e com o tempo fomos ganhando maturidade para as desenvolver. Assim surgiu Path Worse Than Death — uma catarse que demorou a emergir, mas que carrega muito do que sentimos durante esse período.


As faixas misturam o peso do death/doom com nuances progressivas e melancólicas. Como chegaram a essa identidade sonora? Foi algo planeado desde o início da banda ou fruto de uma evolução natural?

Não foi nada planeado, sinceramente. Acho que foi o resultado de um bom convívio e de uma gestão saudável de ideias entre os membros. Isso permitiu chegar a este resultado único, que soa por vezes como algo experimental ou até vanguardista. Para mim, a fase de brainstorming antes de escrevermos um álbum ou EP é essencial. Gosto de vir com a mente aberta, pronta para absorver e filtrar ideias, e também para as estruturar de forma coerente. Esse processo torna-se a base de tudo, para que no fim o som seja de muito bom gosto.


Vocês vêm do Rio Grande do Sul. Como é ser uma banda deste género nesse contexto geográfico e cultural? Que impacto isso teve na vossa trajetória?

Acho que o nosso sotaque gaúcho ajuda bastante a dar uma pronúncia mais forte e ríspida ao inglês — um bom exemplo disso são os Krisiun. Geograficamente, o nosso estado já deu ao mundo bandas incríveis como Rebaelliun, Astafix, Distraught, Hibria, A Sorrowful Dream, entre outras. Isso cria um certo orgulho e uma responsabilidade também — queremos manter esse nível e dar continuidade à força do metal gaúcho.


O álbum trata de temas profundos como depressão, isolamento e misantropia. Como lidam emocionalmente com essas temáticas dentro e fora da música? A criação musical funciona como uma espécie de catarse?

Óptima pergunta. Normalmente, quando as pessoas lêem as nossas letras, pensam que somos perturbados (risos). Mas a verdade é que nasci numa das famílias mais amorosas que poderia desejar, e isso ajudou-me a construir um carácter sólido desde cedo. Talvez por isso eu consiga olhar para a realidade de forma crua e realista. Sou cético, e isso leva-me a uma visão desesperançada — porque vivemos numa sociedade mergulhada em corrupção, mentiras, ganância, egocentrismo, violência, catástrofes naturais, doenças…
Às vezes pergunto-me se já não estaremos a viver o próprio inferno — talvez esta seja apenas a primeira camada. Vejo que há pessoas como eu, que partilham essa visão e que não encaram o pessimismo como uma fase, mas como uma forma de viver. Nada vai mudar no mundo, a não ser nós próprios. E é isso que me faz seguir em frente — atento, crítico e expressando tudo isso através da música.


A colaboração com Tim “Ripper” Owens é um marco importante. Como surgiu essa parceria e o que representa para vocês enquanto banda?

O Tim Ripper é uma pessoa simples, como nós, e incrivelmente inspiradora. Nunca vou esquecer o que ele nos respondeu por e-mail: “This is badass song!” Ter a participação dele numa faixa nossa foi um marco. Mostrou-nos que é possível sim colaborar com grandes nomes do metal mundial, mesmo sendo uma banda extrema e de nicho. É uma conquista que ficará para sempre na nossa história.


Faixas como Last Night of the World e Purge of the Carnal Sins… demonstram um cuidado especial com a estrutura e atmosfera. Como é o vosso processo de composição — há uma liderança definida ou é um trabalho totalmente colaborativo?

Sim, após a fase de brainstorming, normalmente sou eu quem organiza e define as estruturas e andamentos das músicas. Depois, contamos com o Ernani Savaris, nosso produtor e parceiro de longa data, que nos ajuda no estúdio. Ele orienta-nos sobre os acordes e notas que melhor vão soar — seja nos solos, nas bases ou até nas palavras que canto. A influência dele é decisiva para encontrarmos a atmosfera certa para cada música.


Para quem está agora a conhecer os Segregatorum, como definiriam a vossa missão artística dentro do universo do metal extremo? E que lugar desejam ocupar na cena nacional e internacional?

Mais uma excelente pergunta. O nome da banda, traduzido, significa “Dos Segregados”. E isso representa todas as pessoas que partilham a nossa visão de mundo. Se estás farto de toda a podridão à tua volta, das mentiras, da desilusão, das ideologias e promessas de fé que te vendem um futuro melhor… então és um dos nossos. Já morremos para este mundo — e é dessa morte simbólica que nasce a nossa arte.


Um grande abraço, Miguel, e a todos os que nos leram até aqui. Esperamos que a nossa música vos toque de alguma forma — nem que seja para acordar algo que estava adormecido.




Entrevista de Miguel Correia

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